A data de 20 de Novembro é um momento de consciência e de resistência, especialmente para homens e mulheres que, cotidianamente, vivem e sentem ainda os reflexos do que viveram seus ancestrais: a escravidão e o racismo, declarado ou não. A Câmara Municipal dedicou celebração a data que marca o Dia da Consciência Negra em todo o país, especialmente, em Salvador, conhecida como a capital da negritude com a abertura da exposição em homenagem a “Zumbi dos Palmares”, da artista plástica França. A obra, que retrata o líder negro, venceu um concurso realizado pela Câmara em 1987 e ficará em exibição no local durante o mês de novembro para mostrar a conscientização da sociedade pelo respeito ao povo negro. O presidente do legislativo, vereador Leo Prates (DEM), acompanhado dos demais vereadores Ireuda Silva (PRB), Kiki Bispo (PTB), Marta Rodrigues (PT), Moisés Rocha (PT), Sílvio Humberto (PSB) e Toinho Carolino (Podemos), anunciou que a Casa vai realizar exposições voltadas à temática do negro e sua história. Na oportunidade, Prates anunciou também a concessão de 30% de cotas para negros no concurso público da Câmara, através do Projeto de Resolução, de autoria do vereador Sílvio Humberto, fato que marca a política de ação afirmativa no Legislativo.
O presidente da Casa, vereador Leo Prates, afirmou que a Câmara é um espaço de cidadania em que todos têm liberdade de expressão, e que o Legislativo sente-se honrado em celebrar o Dia da Consciência Negra.
Conforme Prates, a iniciativa da exposição em homenagem Zumbi dos Palmares foi dos proprios funcionários da Câmara, para ressaltar a importância desta data comemorativa, celebrada anualmente no dia 20 de dezembro, em memória de Zumbi. “Essa homenagem com a exposição de um quadro com ‘Zumbi dos Palmares’ surgiu dos próprios funcionários da Casa onde terá exposições itinerantes e temáticas dentro dos totens que ficam no Salão Nobre, que é espaço mais importante da Câmara Municipal onde ocorre a recepção de autoridades públicas etc. Isso mostra o espírito de Zumbi em combater o sistema hierarquizado, injusto e desigual, e fazer uma homenagem a ele através de um concurso popular traz o espírito dele de volta à Casa”, destaca o presidente.
Além disso, o presidente destacou as atividades realizadas pela Comissão de Reparação da Casa, presidida pelo vereador Moisés Rocha (PT), durante o todo o mês de novembro, em alusão ao Novembro Negro. Entre as atividades realizadas pela Comissão neste mês de novembro, destacam-se a sessão especial do racismo no esporte no dia 9, a audiência pública sobre o Estatuto da Igualdade Racial no dia 19, estatuto este em que todos os vereadores estão debruçados e a pretensão é que seja aprovado ainda no final deste ano, início do próximo ano; no dia 16, houve o seminário sobre inserção dos negros nas estruturas de poder; no dia 20, a celebração do Dia da Consciência Negra; no dia 22, será realizada uma audiência pública sobre o Estatuto da Igualdade Racial; no dia 23, será uma promovida uma mesa redonda com o tema ‘Negras, Museus e Representatividade’; no mesmo dia 23, sessão especial em combate a intolerância e a marginalização do negro e dia 30, o lançamento do livro ‘Consequências Humanitárias da Intolerância Religiosa’. Estas atividades fazem parte de uma série de ações que a Câmara tem desenvolvido. “Nós, desde o dia em que assumimos, começamos um trabalho de fortalecimento das Comissões. Eu quero destacar o belíssimo trabalho que o presidente da Comissão de Reparação, vereador Moisés Rocha, vem fazendo”, elogia Prates.
O presidente lembrou e reconheceu também a atuação de luta e resistência do atual presidente da Comissão de Cultura, vereador Silvio Humberto, em defesa do povo negro da cidade, inclusive, quando apresentou desde a legislatura passada o Projeto de Resolução aprovado por unanimidade que reserva 30% das cotas para negros no concurso da Câmara, que Prates considera como uma das ações afirmativas da Casa. “Eu tenho a felicidade de ser o primeiro presidente a fazer um concurso público já com essas cotas. Martin Luther King disse que ficaria muito feliz um dia em que as pessoas fossem avaliadas não pela sua cor de pele, mas pelo seu Q.I., pelo seu desempenho e acho que estamos chegando neste sonho. Nós temos ainda que caminhar muito, mas temos caminhado nessa direção”, garante o presidente da Câmara.
Prates lembrou que ainda quando candidato a presidente da Câmara defendeu que “a Mesa Diretora em sua gestão a frente do Legislativo Municipal seria a Mesa Diretoria mais negra do Brasil e aqui uma das mais negras, ou senão, a mais negra da Câmara Municipal”. “Não é a toa que aqui nós temos o corregedor, que é o professor Edvaldo Brito, temos o primeiro secretário, que é o vereador Toinho Carolino, temos o ouvidor, que é o vereador Luiz Carlos Suíca e temos diversos colegas, como o vereador Kiki Bispo”, ressalta.
Na oportunidade, os vereadores Ireuda Silva (PRB), Moisés Rocha (PT), Sílvio Humberto (PSB) e Toinho Carolino (Podemos), que representam a população negra da cidade, fizeram discursos em memória a história, ao exemplo e o legado de Zumbi dos Palmares, um dos ícones da consciência e da resistência negra no país.
A vereadora Ireuda Silva considera a data como um passo de luta e de resistência do povo negro. “Demos um passo. Eu considero um passo, mediante a ainda aquilo que se sofre e o que a população negra ainda passa. Esse dia é um Dia da Consciência Negra, porém, amanhã, é o dia do que para o negro? É o dia em que todas as outras coisas continuam? Eu considero esse dia como um passo apenas. É preciso se lutar muito para chegar onde se deve, porque o Dia de Consciência Negra, na minha opinião, são todos os dias”, afirma Ireuda.
O vereador Toinho Carolino elogiou o trabalho desempenhado pelo presidente Leo Prates à frente da Mesa Diretora em dar condições e estrutura aos trabalhos das Comissões, inclusive, a de Reparação. “Não tem sido diferente como trabalho da Comissão de Reparação que vem resgatando passo a passo aquilo que é devido aos negros nessa cidade”, ressalta. Carolino parabenizou o vereador Silvio Humberto pelo projeto de resolução que garante 30% das cotas para negros no concurso da Câmara e destacou também a figura do vereador Edvaldo Brito que o classificou como um “baluarte da Casa”.
“Este Dia remete a uma reflexão após a morte do nosso grande líder Zumbi dos Palmares, mas quando fazemos uma reflexão positiva da situação do negro em nossa sociedade podemos trazer de volta a vida desse negro que muito lutou pelos seus negros, e não só para que os negros tivessem reconhecimento em nossa sociedade, mas para que a sociedade seja igual e justa para todos”, acredita Toinho.
Para o presidente da Comissão de Cultura da Casa, vereador Sílvio Humberto, os negros tem o que comemorar, porque a data é a luta contra o racismo e em defesa pela igualdade que fazem parte de uma construção coletiva.
“Antes, era só um dia como outro qualquer. Fomos nós que fomos revisitar a história e fizemos a nossa própria história. Nós damos visibilidade a esta data que é um marco. Começamos com um dia, virou uma semana, hoje tem o Novembro Negro e se fala da questão racial de janeiro a dezembro. É um passo importante da mobilização dos negros por dias melhores. O racismo é um verdadeiro atrasa lado. A gente tem que se juntar e isso não significa jogar o problema para debaixo do tapete. A sociedade brasileira precisa entender que o problema do racismo não é somente da população negra e indígena. O que fazer para mudar? As pessoas precisam se envolver, respeitar e acreditar nessa cidade e a gente precisa mudar a cor do poder nessa cidade, e isso, a gente vai fazer juntando as pessoas, dizendo que é pedagógico a alternância de poder com a alternância de cor. O que nós estamos fazendo é garantir a oportunidade que nesta cidade nunca teve, de fato e de verdade, e a nossa mobilização de envolver as pessoas em dizer que é possível sim e não tem nada que limite. A cor de pele não pode se um limitador. A gente não pode ter um discurso de ser chamado de uma cidade capital da negritude e quando você olha para os espaços de poder nessa cidade, isso não está refletido. A cidade tem perdido muito por ter constantemente secundarizado essa diversidade. É preciso que as pessoas entendam que nós temos um potencial enorme e acredito na construção coletiva, porque não há saídas individuais para o racismo, só há saídas coletivas”, defende Sílvio.
Conforme o presidente da Comissão de Reparação, vereador Moisés Rocha, o Dia da Consciência Negra é um dia de resistência e de luta, mas conforme o vereador, não temos como não celebrar o fato de nós termos tido um herói que resistiu bravamente e que resiste até hoje. “Nós celebramos a imortalidade de Zumbi dos Palmares. Nós celebramos 322 anos de imortalidade, porque eles tentaram calar um voz, acabar com uma luta e criaram uma referência a toda a população negra brasileira. Nós temos que celebrar sim e temos que comemorar o fato de Zumbi ter se rebelado lá trás, não ter se rendido, não ter se entregue e ter ficado até a morte, dizendo que queria uma sociedade mais justa e mais igual, e isso faz com que dentro de nós flua esse espírito de Zumbi e, por isso, celebramos. Ao mesmo tempo, não temos dúvida que os espaços que avançamos foram muito curtos e passos curtos que não foram dados de graça, foram dados com muita luta de muitos outros que vieram e sucederam Zumbi e que sucedem até hoje, mas ainda temos uma sociedade doente que tem um muro que tenta impedir a ascensão do povo negro, e se esse muro é o muro do racismo, vamos derrubar com a nossa consciência negra. Vamos nos organizar cada vez mais, porque como dizia Steve Biko, ‘ter consciência negra é a percepção do homem e da mulher negra que somente juntos iremos vencer a barreira do escravismo’. Essa unidade é necessária para que quem está do outro lado, os que querem nos dominar, entendam que o problema do racismo não é um problema nosso, é de toda a sociedade e, principalmente, deles que são os racistas. Bob Marley dizia que enquanto os irmãos na terra morrerem de fome e de sede, haverá guerra, e enquanto a cor da pele e dos olhos forem o fator fundamental para ascensão das pessoas haverá guerra. Se esse país permanecer nessa doença, nós temos uma maioria que começa a se tocar e começa a gritar e, certamente, não teremos um Brasil de paz e de igualdade”, disse Moisés.
Moisés frisou que a Comissão tem travado esse debate e destacou que ao longo da história da Câmara de Vereadores de Salvador, o colegiado foi o que mais se reuniu em todos os tempos de Comissão de Reparação. “Nós estamos fazendo o Estatuto da Igualdade Racial e esperamos votar ainda este ano; Neste mês de novembro, estamos com uma série de atividades, como exposição no Centro de Cultura, audiências públicas do Estatuto, uma sessão especial com a inserção do negro no mercado de trabalho, já teve uma audiência debatendo a questão do negro no esporte, vai ter uma série de atividades até o final de novembro, inclusive, como lançamento de um livro, falando sobre intolerância religiosa. O que nós podemos fazer é conscientizar, é divulgar, é publicar, é enfrentar; nós estivemos no Colégio Anchieta para combater atividade racista, nós estivemos no Terreiro do Curuzu onde teve uma invasão da Polícia para podermos fazer o bom combate a esse tipo de ação. Nós temos trabalhado incessantemente, mas o problema é que o racismo acontece a cada segundo e a cada instante”, enumera Moisés.
Na visão do vereador Edvaldo Brito, que é também jurista e professor de Direito, os negros têm sempre o que comemorar, porque a referência maior é Zumbi, o sacrifício de Zumbi, a ação de Zumbi para que nós tivéssemos a liberdade, mas conforme ele, a comemoração não é só de lembrar em Zumbi, mas de ter a consciência e o conhecimento dos entraves que impedem os negros de buscarem ascensão social. “Nós podemos dizer que uma vida com dignidade humana decorre da nossa educação para termos os instrumentos a fim de que possamos competir no mercado de trabalho e em toda atividade social, pois sem educação não adianta nada. Temos o que comemorar pela luta de muitos de nós, pela igualdade de oportunidades para podermos competir”, defende Edvaldo.
O Dia da Consciência Negra foi comemorado pela Câmara Municipal também em sessão regimental realizada na tarde de segunda-feira (20), no plenário da Casa. O mês de novembro é marcado pelo Dia da Consciência Negra, celebrado sempre no dia 20, data da morte de Zumbi dos Palmares, em 1695. A data procura remeter à resistência do negro no Brasil. Na cidade, diversas atividades estão sendo realizadas com o objetivo de debater e despertar o combate ao racismo, que integram a programação do Novembro Negro.
Dia de Resistência / Zumbi foi o último dos líderes do Quilombo dos Palmares, o maior dos quilombos do período colonial. Ele nasceu na então Capitania de Pernambuco, na serra da Barriga, em 1655, região hoje pertencente ao município de União dos Palmares, no estado de Alagoas. Em seis de fevereiro de 1694 a capital de Palmares foi destruída e Zumbi ferido. Apesar de ter sobrevivido, foi traído e surpreendido em seu reduto. Apunhalado, resiste, mas é morto com vinte guerreiros quase dois anos após a batalha, em 20 de novembro de 1695. Teve a cabeça cortada, salgada e levada ao governador da capitania. No Recife, a cabeça foi exposta em praça pública no Pátio do Carmo, visando desmentir a crença da população sobre a lenda da imortalidade de Zumbi. Sua história atravessou os tempos e Zumbi permanece como símbolo da luta pela liberdade e igualdade racial até os dias de hoje.
Rafael Santana