
A médica Kátia Vargas foi absolvida da acusação de homicídio triplamente qualificado, referente à morte dos irmãos Emanuel e Emanuelle Gomes Dias, de 21 e 23 anos. A decisão foi confirmada na noite desta quarta-feira, 6, inicialmente pelos promotores de Justiça Luciano Assis e Davi Gallo.
A sentença não chegou a ser proferida pela juíza Gelzi Maria Souza que, após o início de um tumulto, solicitou a retirada do público do Salão do Júri, onde aconteceu o julgamento.
?”O Conselho de Sentença (…) decidiu, por maioria de votos (…) que a acusada não praticou crime de homicídio qualificado, pelo motivo fútil, perigo comum e recurso que impossibilitou a defesa da vítima”, relata a magistrada no documento oficial da sentença, divulgado mais tarde pelo Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA).
A decisão causou revolta na família das vítimas, que se manifestaram ainda no Salão do Júri. A mãe dos jovens, Marinúbia Gomes Barbosa, subiu em uma cadeira e gritou que o caso “é uma vergonha”.
Já a tia das vítimas, Mércia Gomes, ameaçou matar a médica. “Ela matou minha sobrinha linda. Kátia Vargas é assasina. Ela matou. Eu não sei o que está por trás disso. Ela vai morrer. Alguém dá conta dela”, desabafou.
O julgamento começou na terça (5), no Fórum Ruy Barbosa, em Nazaré. No primeiro dia, foram ouvidas as 10 testemunhas – cinco de acusação e cinco de defesa. Já esta quarta, 6, começou com o interrogatório da ré.
Durante seu depoimento, Kátia Vargas afirmou que não colidiu seu veículo, um Kia Sorrento, na motocicleta onde estavam Emanuel e Emanuelle. Segundo ela, houve uma tentativa de ultrapassagem, e não a intenção de matar os irmãos.
Sentada no banco dos réus, Vargas se limitou a responder apenas as perguntas da juíza presidente Gelzi Maria Souza, aos questionamentos dos sete jurados e às indagações feitas pela equipe de defesa, liderada pelo advogado José Luís Oliveira Lima.
Depoimento
Durante o depoimento, um jurado questionou se a médica acreditava que sua ultrapassagem pode ter levado à queda da moto. “Pode ser que sim”, respondeu Vargas. Conforme a médica, ela acelerou para tentar ultrapassar a moto conduzida por Emanuel, após ser interpelada por ele. Contudo, ela negou qualquer discussão com o jovem.
A médica afirmou também que não bateu na moto, como é defendido pelo Ministério Público. Kátia Vargas explicou ainda que não se recorda do que aconteceu após o acidente.
“Depois do acidente, não lembro de mais nada. Só lembro que um policial veio me atender”, afirmou a médica, que disse viver sob efeito de remédios, o que pode, conforme ela, afetar a sua memória.
Ela ressaltou também como sua vida parou após o acidente e como ficou sem trabalhar durante um período.
Após o depoimento da ré, representantes do Ministério Público, da acusação e da defesa da médica se pronunciaram.
Apelação
Agora, explicou o advogado da família das vítimas, Daniel Keller, a acusação, representada por ele e pelos promotores de Justiça Luciano Assis e David Gallo, terão cinco dias para apresentar um recurso de apelação pedindo ao TJ-BA a revisão da sentença judicial.
“Estamos apenas no primeiro grau. É prematuro dizer isso, mas pode ser inclusive que o Tribunal de Justiça anule esse júri”, afirma o acusador, ao defender os recursos como “parte de sistemas democráticos”.
Ele listou ainda o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF) como cortes que ainda poderão analisar o caso.
“A família vê isso como uma espécie de guerra. Foi uma luta de quatro anos. Perdemos uma batalha, mas a guerra ainda não acabou. Ainda é uma grande jornada. É o fim do início”, promete.
Na saída do Fórum Ruy Barbosa, a mãe das vítimas chorava muito, amparada por amigos e familiares. Ao referir-se à Justiça divina, dizendo “agradecer a Deus”, apontava para o céu.
“Ela foi inocentada. Ninguém sabe como. Cabe recurso, vamos recorrer. Deus está no controle. É uma dor muito grande, eu não lutei quatro anos para nada. Vou continuar lutando, a justiça não foi feita. Continuo acreditando na Justiça. Não vai ficar impune”, declara Marinúbia.
Revolta no MP
O burburinho causado no Tribunal do Júri, mesmo sem a leitura oficial da sentença pela juíza, foi causado por afirmações que os promotores de Justiça Luciano Assis e David Gallo davam a emissoras de TV ao sair do fórum, logo após deixar a sala secreta onde se reuniam o júri e a magistrada.
Ambos falaram revoltados sobre a decisão. De acordo com análise feita por Assis, a sentença prolatada foi “manifestamente contrária à prova dos autos”.
Já David Gallo foi duro ao criticar os jurados que absolveram a médica Kátia Vargas. “Quatro pessoas sem compromisso com a justiça sentaram ali pré-determinadas a absolver uma pessoa que cometeu um crime bárbaro. A justiça nesse país é para negro e para pobre”, acusa o promotor.
Reação de Vargas
Do outro lado, o advogado criminalista José Luiz Mendes de Oliveira Lima, chefe da equipe de defesa da oftalmologista, se disse “satisfeito com o resultado” que absolveu a oftalmologista.
Conforme a descrição feita por ele, ao receber a notícia, a médica o abraçou e “começou a chorar, chorou muito”. De acordo com o defensor, “a família ficou um pouco anestesiada”.
“Nós choramos muito. É impossível que uma pessoa que se envolveu nessa [situação] retome a vida normal”, afirma Oliveira Lima, avaliando, no entanto, que “modificar uma decisão do plenário do Tribunal do Júri não é uma coisa simples”.
“Respeito a opinião do Ministério Público, mas o tribunal aceitou a primeira tese nossa”, afirma o defensor da acusada.
Fonte: A TARDE On Line