Neste dia 18 de Outubro, Dia do Médico, os profissionais da medicina de todo o país não tem o que comemorar em razão do descaso dos governos federal, estadual e municipal no trato com a saúde pública. Os problemas de financiamento e de gestão se acumulam com graves consequências para o trabalho médico, de acordo com informações do Jornal do Conselho Federal de Medicina (CFM) – em sua edição publicada em junho deste ano. O Orçamento de 2016 com R$ 2,5 bilhões a menos do que o previsto para 2015, baixa execução orçamentária nas obras de infraestrutura, redução da participação da União nos gastos com saúde em comparação com estados e municípios e a consequente queda no número de leitos de internação (menos 24 mil entre dezembro de 2010 e dezembro de 2015) comprovam quão crítica está a situação da saúde no País.
Além disso, há o baixo gasto per capita em saúde pelos governos federal, estaduais e municipais, que aplicaram, em 2014, apenas R$ 3,89 por dia para garantir a saúde de cada brasileiro. São essas informações, que delineiam o tamanho da crise enfrentada pela assistência no País, em especial na rede pública, que o Conselho Federal de Medicina (CFM) tem divulgado amplamente pela imprensa e apresentado a outros órgãos interessados no controle social na área da saúde, mostrando a situação em que se encontra a saúde pública no Brasil. Esse diagnóstico, que tem sido acompanhado pela apresentação de um conjunto de propostas elaboradas pelo CFM, está baseado em levantamentos feitos pela autarquia e por outras entidades com base em dados o ciais disponibilizados pelo poder público.
O CFM defende melhorias na gestão e cobra controle maior sobre a corrupção, pois, segundo o Ministério da Transparência, a saúde foi responsável por 29% dos recursos federais desviados para a corrupção nos últimos catorze anos. Os parcos e mal aplicados recursos em saúde levam a falta ou sucateamento da infraestrutura existente. Dos R$ 97,5 bilhões autorizados para realização de obras (construções e reformas) e compra de equipamentos entre 2003 e 2005, apenas R$ 38,2 bilhões foram efetivamente investidos nisso.
Entre as propostas para o sistema de saúde brasileiro, o CFM e a AMB defendem os direitos e os princípios do SUS, garantindo-lhe a adequada participação do Estado no custeio das ações e serviços de saúde, conforme preconiza a Emenda Constitucional nº 29/2000, em detrimento de qualquer proposta de descontingenciar recursos específicos para a área.
Com isso, seria possível oferecer à população acesso a um sistema público de saúde universal, equitativo, integral, gratuito, de qualidade e com controle social, e assegurar o compromisso efetivo da gestão do SUS com a adoção de políticas, programas e ações de saúde pública nos âmbitos da promoção, prevenção e atenção.
Nesse contexto, haveria espaço para a criação de uma carreira de Estado sob a responsabilidade da União – para médicos e outros profissionais da área de saúde. O respeito à Lei nº 12.842/2013 (Ato Médico) – descartando-se propostas que autorizam, estimulam ou proponham a transposição de atividades privativas do médico para profissionais de outras categorias da saúde – também é defendido pelo Conselho e pela Associação.
Má gestão compromete assistência
Para as entidades médicas, as razões para a crise atual da saúde brasileira residem no baixo financiamento e na má gestão. Além da insuficiência de leitos de internação e de unidades de terapia intensiva (UTI), as unidades básicas de saúde (UBSs), que seriam a porta de entrada do paciente no sistema de saúde, também estão sucateadas. Fiscalização realizada ano passado pelo sistema conselhal de medicina em 1.266 UBSs constatou que 58% delas apresentavam mais de 30 itens em desconformidade com o estabelecido pelas normas sanitárias em vigor. Em algumas faltavam até estetoscópio (23%) e termômetro (6%). A maioria das obras em UBSs estava incluída no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que empacou. Das obras previstas, o governo entregou, até outubro do ano passado, apenas 25,7% do prometido em 2011.
Falta dinheiro também para remunerar médicos e demais profissionais de saúde. De 2008 a 2014, levantamento do CFM mostrou que a perda acumulada nos honorários médicos em alguns procedimentos acumulou quase 1.300%. Segundo o levantamento, o Sistema Único de Saúde (SUS) paga, de acordo com a Tabela SUS, cerca de R$ 10,00 por cada consulta ambulatorial.
A mesma defasagem ocorre nos procedimentos hospitalares. Para um parto normal, o valor da Autorização de Internação Hospitalar (AIH) é de R$ 550,00. Essa discrepância tem levado ao fechamento de leitos nos hospitais filantrópicos, quando não ao encerramento definitivo das instituições.
Na saúde suplementar, a situação também não é das melhores, como mostra pesquisa realizada pela Associação Paulista de Medicina (APM): 79% dos entrevistados afirmaram ter encontrado algum tipo de entrave ao utilizar o convênio nos 24 meses que antecederam ao questionamento.
Execução orçamentária não será cumprida
Até o fim de 2016, o Ministério da Saúde deixará de executar cerca de R$ 10 bilhões do seu orçamento previsto para o ano. Essa conclusão foi possível a partir de dados levantados pela ONG Contas Abertas, que fez uma análise da execução orçamentária da área dos primeiros cinco meses do atual exercício em comparação com o realizado no mesmo período de 2015.
A ONG também fez os cálculos levando em consideração a inflação do período medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). O Ministério da Saúde gastou, de janeiro a maio de 2015, R$ 43,7 bilhões. Se fosse atualizado monetariamente, esse valor seria hoje de R$ 48 bilhões. Como no mesmo período deste ano o Ministério da Saúde investiu R$ 44,8 bilhões, é possível dizer que, neste ano e considerada a inflação, o Ministério gastou R$ 3,2 bilhões a menos do que no mesmo período em 2015.
“Lamentavelmente, os dados disponibilizados pelo Ministério do Planejamento dão sinais de que a participação do Estado nas despesas com saúde no país continuará, em 2016, abaixo das expectativas”, analisa o presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), Carlos Vital. O dirigente afirma entender que cabem ao governo interino, no cenário de crise atual, a contenção de gastos públicos e a austeridade social, mas “sem detrimento dos princípios fundamentais do Estado democrático de direito”.
No que se refere à área da saúde, o poder público é responsável por apenas 47% dos gastos no País, sendo considerada a menor contribuição estatal dentre as nações com modelos de assistência à saúde com caráter universal, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Em países como Reino Unido, Alemanha e Argentina esse percentual é de 83,5%, 76,7% e 67,7%, respectivamente.
“Com o prolongamento desse comportamento, a quantia de US$ 523 em gasto público per capita com saúde no País poderá ser reduzida e ficar mais distante da média dispendida pelas nações americanas, estabelecida em US$ 1.816, o que nos levaria a convivência mais frequente com os hospitais de campanha no âmbito do SUS”, destaca Carlos Vital.
O 1º vice-presidente do CFM Mauro Ribeiro alerta que “está tudo um caos, mas o setor de saúde tem de ser preservado e considerado prioritário. Não podemos esquecer que menos recursos na saúde podem significar mais mortes por falta de assistência”.
Fonte: Conselho Federal de Medicina/Foto: Reprodução/Blog Jornalismo 24 Horas